- Então foi isso, doutora - Tinha contado tudo que tinha acontecido nos últimos dias, minha conversa com Bethina no terraço, o vácuo dela, as respostas simples - E eu não sei o que fazer.
- Bom - Ela terminou de anotar algo - Se me permite a intimidade... cara, você foi meio cuzão com ela né? Aliás, você quer mesmo transicionar?
- Quero.
- Então, é pode pá ou nem rola - Adorava quando ela soltava uma gíria dessas, me lembrava alguns colegas da empresa - Se você ta com certeza do que vai fazer, o mundo inteiro vai ter que saber, inclusive seus pais.
Aquelas palavras eram como um tapa na cara. Mas era isso, eu precisava acordar, a decisão estava tomada, a junta de psicólogos estava marcada para começar logo depois da páscoa e eu sentia que essa era a resposta que eu tanto buscava, o que me impedia de passar mais de dois minutos na frente do espelho.
Uma garoa fina molhava a rua no caminho de volta para casa naquela sexta-feira. É como dizem em Portugal: chuva molha-tolos. Aparentemente eu não devia me molhar mas cheguei em casa ensopado, como precisava pensar fui direto para o banho. Teríamos alguns dias de folga no meio do ano por algo como alguma reforma pequena, troca dos servidores ou algo assim, eu realmente não ligava, mas seria uma semana inteira de folga. Talvez fosse essa a data que eu precisava.
Escancarei a janela do quarto pro ar de chuva entrar, no entanto ao longe já via algumas estrelas que venciam a poluição visual da Metrópole, por algum motivo resolvi colocar um vestido vermelho com cintura definida por um cinto preto, por baixo uma saia de tule ajudava a dar um volume maior pra bunda. Parei diante do espelho. Eu estava linda. Tsc. Ela tem razão. Hora de dar um salto de fé. Com a mão ainda tremendo suavemente digitei olhando o sorriso de Bethina na foto de avatar.
"No meio do ano."
"Quer ir comigo? Preciso do seu apoio."
O visor do pequeno aparelho mostrava vinte e duas horas e oito minutos. Ela ficou online e saiu. Merda. Eu sabia que ela não estava disposta a ir tão longe assim. Bem feito pra mim, fui confiar na pessoa errada e... calaboca, Fê. Ela te ama. Você ama ela. Talvez ela nem tenha visto ainda, do jeito que ela ralou com os novatos essa semana devia estar morta de cansada. Não surta ainda, espera pelo menos o dia raiar. Odiava minha consciência.
Fiquei trocando de canal na televisão até achar algo simples o suficiente para que não precisasse pensar, só ocupar o espaço entre meu inconsciente e meu consciente. Com cuidado me sentei no sofá tentando evitar ao máximo amarrotar esse vestido. Só agora notei que tinha colocado as luvas brancas, só faltava uma maquiagem digna pra completar. Certamente Freya faria algo maravilhoso em minutos.
Não conseguia prestar atenção na imagem de uma raposa tentando pegar um coelho na neve. A cada seis segundos tinha de verificar se Bethina me respondia. E a merda é que a bateria do celular estava próxima do zero. Droga. Caminhei até a cozinha, coloquei o aparelho para carregar. A tela acendeu "vinte e duas e cinquenta e quatro minutos". Melhor ir dormir. A campainha tocou. Merda. Merda. Merda.
Como que o irresponsável da portaria não avisa que tem alguém subindo? Eu levaria essa reclamação pro síndico na próxima reunião, francamente... com todo o cuidado do mundo caminhei até a porta, o olho mágico não mostrava absolutamente nada. Trote de crianças? Sério? Com receio abri um pouco a porta e a lufada de ar quente do corredor trouxe a figura de Bethina empurrando a porta.
- Olha só ela - O tom era amistoso ao mesmo tempo que era ácido - Então temos um martelo batido mesmo?
- S-sim! - Respirei fundo - Meio do ano!
- Certeza certeza? - Ela entrou fechando a porta e já me envolvendo em um abraço - Tu não me enrola, garota.
Era a primeira vez que ela me chamava de garota, pelo menos em todas as falas. Por algum motivo que desconhecia isso me deu mais energia, mais certeza de que aquele caminho, aquela decisão, era a ideal. Respondi concordando com a cabeça.
- É sim meu amor - Roubei um selinho rápido - Você vai comigo né?
- Se a chefia liberar eu vou sim.
- Vai liberar, falo com a Rafaela e tudo bem.
- Rafaela... - O olhar dela ficou perdido alguns instantes - É, vamos ver.
- E o que trouxe na sacola?
- Ahhhhh... a mocinha já está curiosa?
- Estou sim.
- Pois bem - Ela tirou a fita do cabelo já colocando em meus olhos - Vai ser uma surpresa - Pude sentir a respiração quente dela ao pé do meu ouvido - Você confia em mim?
- Cegamente - Com a venda eu mal conseguia ver sombras do que acontecia, foi nesse instante que a mão dela tomou a minha - Pra onde vamos?
- Calada - Ao menos estávamos caminhando pra dentro do apartamento até que Bethina parou de súbito - Aqui... ajoelha e fica caladinha enquanto eu me preparo.
- Vai brincar de Domme... - falei com um sorriso fino já mordiscando o lábio inferior - Gostei.
- Eu não te mandei calar a boca?
- Desculpa... - resolvi entrar na brincadeira, vamos ver até onde ela iria - ... senhora.
Ela não respondeu, na real eu não ouvia ela em lugar nenhum. Será que aquela maluquinha tá achando que vai me deixar de joelhos no meio da sala? Ah, foda-se, vou erguer a venda e ver o que tá rolando, ela não é a Rafaela.
- Tira esse dedo daí - A voz dela foi se aproximando - Abre bem a boca.
Confesso que tinha uma vaga ideia do que viria ali, provavelmente ela ainda estava decidindo o que fazer. Ah essas Dommes de primeira viagem. Fiquei quase um minuto de boca aberta esperando algo acontecer, fechei a boca respirando fundo.
- Quer ajuda?
- Eu já não te mandei calar essa boca, Fernanda? Será que vou ter que te amordaçar?
- Olha ela... até parece uma Domme.
- Pareço é? - Ela puxou meu cabelo fazendo minha cabeça ir rá trás - Vou te mostrar o que aprendi... ou melhor, a surpresa que te comprei.
- S-surpresa?
- Ah, agora a menina quer saber o que planejei pra esse momento... na-na-ni-na-não. - O tom de voz dela era intenso, decidido, lembrava quando ela saiu do hospital ou ainda quando discutimos no terraço da empresa - Levanta e fica paradinha - Atendi prontamente - Adorei o vestido... até com a saia de tule por baixo, é uma mocinha linda essa minha namorada, dá vontade de morder... - Alguns segundos de silêncio e a voz dela veio ao pé do meu ouvido, sussurrando - ... ou comer ela, que tal?
Confesso que não era uma das coisas mais inesperadas vindas de Bethina, mas ao mesmo tempo não encaixava direito a voz com o que era dito, essas frases caberiam facilmente na Flávia, Rafaela ou até mesmo na Freya, agora nela? O foda é que eu estava ficando excitado com a possibilidade do que estava por vir. O silêncio imperou quando a ouvi ir até a televisão e ligar alguma coisa, reconhecia o estilo, as batidas de LoFi HipHop eram hipnóticas e, certamente, mexiam com as ondas alfas do cérebro. Feito isso ela voltou a pegar minha mão.
- Pra onde agora, senhora?
- Mas que menina falante essa que eu arrumei... - Ela me guiava enquanto eu tentava lembrar a planta do apartamento, parecia ser a cozinha, mas o vento fresco denunciou o quarto - Deita aqui, de barriga pra cima... - Ao que deitei a mão gelada dela subiu por minhas coxas - Sem calcinha? Olha que menina safada essa... e essa coisinha durinha aqui? - Senti um peteleco na cabeça do meu pau que latejava frente a toda aquela cena que, por mais que a visão estivesse bloqueada, outros sentidos se intensificavam e me faziam vê-la em uma sinestesia quase perfeita do meu corpo - Hoje não vamos usar ela, agora afasta as pernas pra cima... - Não ousei desobedecer, queria ver até onde iria essa toca de coelho - isso, boa menina, se continuar assim vai ganhar um doce... aliás - Senti o corpo quente dela sobre o meu - Vamos tirar isso daqui e começar a brincadeira, não quero que perca nenhum detalhe.
Dito isso a venda saiu e meus olhos levaram alguns instantes até se habituarem à luz normal do quarto. Tão logo a imagem ganhou definição corri meu corpo com a vista, Bethina estava com uma blusa regata preta e uma leggin igualmente preta, algo destoava ao correr da cintura. Ergui o corpo e minhas suspeitas estavam se tornando fatos. Quis esboçar alguma reação, mas minha voz não saiu, sobretudo quando ela colocou o lubrificante pegajoso e gelado na entrada de meu cu, soltei a cabeça na cama sentindo o gelado escorrer pra além, tudo pra ser recolhido por algo maleável, um pouco escorregadio e grande.
Minha respiração se acelerava enquanto aquele membro de borracha tentava entrar, sentia minhas pregas cedendo, uma após a outra, até a cabeça daquele colosso me penetrava, a respiração se acelerou, os batimentos também subiram de ritmo, ainda assim a dor era menor que o prazer envolvido. O exato instante que a ponta ultrapassou a última barreira abri os olhos e afastei os lábios, a respiração outrora acelerada agora beirava a ofegância.
O tempo deixou de existir, só havia aquele objeto entrando cada vez mais fundo e a sensação de algo ia subir pelo meu canal intestinal e continuar sua escalada até onde fosse possível, o rosto virou lentamente na direção da janela no instante que uma chuva de pingos grossos romperam o céu. Quando, enfim, senti a pele de Bethina tocar a minha soube que acabou. Deixei as pálpebras fecharem uma ou duas vezes sentindo toda a extensão daquele consolo imenso dentro de minha bunda. Claro que já tinha tido experiências com brinquedos assim, mas nunca com alguém que eu amava e a sensação estava sendo praticamente indescritível. Ao fundo a música baixa era a única coisa que dizia que o tempo ainda estava andando.
Quando senti o corpo dela se afastando suavemente um raio rompeu o céu e a primeira estocada completou seu ciclo no exato instante que a energia acabou deixando toda aquela parte da Metrópole às escuras. Conforme minha excitação aumentava sentia que Bethina acelerava o ritmo, decididamente eu não duraria muito tempo nas mãos dela. Foi quando a velocidade diminuiu e o corpo dela veio sobre o meu, os lábios dela procuravam os meus, uma vez beijo iniciado o movimento outrora pausado voltou com cadência máxima até o instante em que o orgasmo explodiu em meu pau duro entre nossos corpos. Com delicadeza Bethina saiu lentamente tirando o brinquedo de dentro da minha bunda. Quando, enfim, saiu senti o dedo dela alisando.
- Acha que acabou, menina? - Voltei a sentir o corpo dela no meu - Eu também estou com tesão... - E antes que eu pudesse balbuciar qualquer palavra os joelhos dela pararam um de cada lado de minha cabeça - Me chupa, amor?
E assim, entre um trovão e outro toquei minha língua na intimidade de Bethia que continha os gemidos baixos passando a mão pelo corpo, vez por outra jurava que ela me olhava "trabalhando", mas era inevitável que logo ela não suportaria muito meu ritmo que agora tinha uma sutil ajuda do dedo indicador, os gemidos dela ganhavam volume conforme se aproximava do orgasmo até que pararam completamente. Antes que eu pudesse falar alguma coisa a boca dela voltou à minha e, entre trovões e barulho de chuva nos deixamos adormecer em um sono de reconciliação e com novos prazeres redescobertos.
Uma salva para o amor.